domingo, 27 de julho de 2014

Casamentos...

Esta publicação é mais um aviso de alerta do que um desabafo.
Não é sensato querer ser meu amigo, querer fazer parte daqueles que considero "meus".
Deixe-me explicar a razão (ou as razões):

  • Sou uma boa ouvinte, meu ombro estará a postos sempre que você quiser chorar suas pitangas;
  • Vou torcer por cada projeto seu, vibrar com cada vitória e lhe consolar a cada derrota;
  • Vou abraçar como meus sua família e seus amigos, tendo por eles o mesmo carinho que tenho por você;
  • Vou tomar o seu partido e comprar suas brigas, lhe defendendo de qualquer ofensa;
  • Vou aguentar seus pitis, mimimis e dramas, muitas vezes rindo e lhe fazendo rir disso tudo.
 Se sou assim, deveria ser uma maravilha ser meu amigo não é mesmo? 
Não, não é... 
Primeiro foi o "venha a nós", agora é o "ao vosso reino":

  • Amizade e amor na minha cabeça são a mesma coisa, então uma amizade é quase um casamento, com todo o compromisso que a palavra inspira;
  • Vou acreditar em tudo o que você me disser, e se você mentir para mim, vou ficar magoada, de verdade;
  • Sou daquelas amigas chatas, que sentem saudade e cobram presença.  Vou querer estar por perto sempre (ou quase sempre);
  • Vou querer que você tenha por mim a mesma consideração que tenho por você;
  • Vou esperar que nossa amizade dure muitos anos, de preferência a vida inteira.
Ficou entendido?
Já passei do tempo de ter "amores de papel", hoje valorizo o que é sólido, confiável, duradouro (sim, meu marido tem muito a ver com isso). Então para quem gosta de contatos superficiais, abraços "gelados", sorrisos fingidos, amores de papel, e "eu te amo de brincadeirinha", é bom passar batido por mim.
Se aproxime apenas se você tiver interesse em um "casamento fraterno".
Fica a dica! 

quarta-feira, 9 de abril de 2014

O Demônio do Meio-dia


Sua chegada é quase sempre silenciosa, imperceptível.
O cabelo cai, a pele perde o viço, o brilho some do olhar...
É só cansaço, você pode dizer.
Mas calma, não pára por aí...

O sono se torna um traidor, aparece quando não deve e some quando se precisa dele.
A fome? Bom, no meu caso ela some completamente.
E então além do cabelo fraco, da pele feia e do olhar apagado, eu também fico magra.
Magra não, muito magra... magra e pálida, como um cadáver.
Mas eu não sou um cadáver.
Não ainda.
Apesar de me arrastar como uma sombra e só sair da cama porque enfim sou obrigada...

Minha mãe me dá umas sacudidas, me força a me olhar no espelho e ver no que eu estou me transformando.
E então eu a vejo, ali, ao meu lado...
Uma velha conhecida (atentem bem, não amiga, muito menos querida).
Mais uma vez ela está aqui.
Mais uma vez ela veio sem ser chamada nem desejada.
E mais uma vez eu vou ter que mandá-la embora, mesmo sabendo como ela é teimosa e como vai aparecer novamente quando eu menos esperar...

Mas não posso deixá-la ficar nem me acostumar com sua presença.
Tenho que lutar. Sempre.

Me passe a Sertralina, por favor.

sábado, 22 de fevereiro de 2014

Sobre o rompimento do meu dique...


O limite foi ultrapassado.
A dor predominou.
E o resto de autocontrole, de disciplina, de sanidade, se rendeu ao sofrimento...
E afogada em autopiedade e ressentimento, afundei na minha própria sombra.
E emergi cega de fúria e disposta a enfrentar (e afrontar) todo mundo.
E como um espelho macabro, eu comecei a apontar e julgar nos outros, tudo aquilo qye não era aceito dentro de mim.
E os mais próximos, os mais amados, foram os mais julgados, os mais feridos.
E com razão, eles se afastaram, fugiram da minha presença tão cáustica...
E eu me vi só. Os amigos não confiavam mais em mim. Como confiar em alguém que num repente, pode surtar e destratar todo mundo?
Como querer por perto alguém que derrama veneno pelos olhos e pela boca?
Então, sozinha, sem ter a quem atacar, coloquei a mim mesma no banco dos réus do meu próprio julgamento.
E como todo condenado, revi toda a minha conduta e me arrependi profundamente dos meus atos desvairados.
E fui tomada pela vergonha.
Vergonha de ter tratado tão mal aqueles a quem eu mais amo.
E é essa vergonha que me impede de pedir perdão pessoalmente.
É a vergonha que me faz ficar em casa, por achar que não mereço mais estar perto deles.
É a vergonha que barra minhas manifestações de carinho, afinal como alguémque te encheu de patada pode te abraçar e dizer que te ama?
Mas eu amo sim, e muito...
E assim, covarde de tanta vergonha, tento aos poucos, me aproximar de novo...

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Testamento Lírico

"Se quiserem saber se pedi muito
Ou se nada pedi, nesta minha vida,
Saiba, senhor, que sempre me perdi

Na criança que fui, tão confundida.

À noite ouvia vozes e regressos.
A noite me falava sempre, sempre
Do possível de fábulas. de fadas.

O mundo na varanda. Céu aberto.
Castanheiras doiradas. Meu espanto.
Diante das muitas falas, das risadas.

Eu era uma criança delirante.

Nem soube defender-me das palavras.
Nem soube dizer das aflições, da mágoa
De não saber dizer coisas amantes.

O que vivia em mim, sempre calava.

E não sou mais que a infância. Nem pretendo
Ser outra, comedida. Ah, se soubésseis!
Ter escolhido um mundo, este em que vivo

Ter rituais e gestos e lembranças.
Viver secretamente. Em sigilo
Permanecer aquela, esquiva e dócil

Querer deixar um testamento lírico

E escutar (apesar) entre as paredes
Um ruído inquietante de sorrisos.
Uma boca de plumas, murmurante.

Nem sempre há de falar-vos um poeta.
E ainda que minha voz não seja ouvida
Um dentre vós resguardará (por certo)

A criança que foi
Tão confundida.

(Hilda Hilst)